Abajur iluminado.

Texto escrito por Abraão Stephanes, e Ana Paula Mello.
Escrevemos juntos esse texto, cada um escreveu um pouco, até chegar num ponto agradável para nós.


Iniciando assim pensando em algo bom, ruim ou nem tão momentâneo, parece-nos incrível falar sobre o que não aparece no escuro. Assim como restos de comida estão sobrepostos sobre nossas cargas dentárias, há muitas coisas no escuro, muitas coisas a serem iluminadas. Queremos saber onde está o que não está, nem mais aqui, nem embaixo da cama, nem na terceira gaveta do armário torto ou nas partituras sobre o piano empoeirado. Quando seu instrumento não é tocado como deveria, a música morre, e não consegue iluminar lá fora, pois ainda há muitas coisas no escuro, muitas coisas perdidas, precisando de luz. Quando seus olhos estão fechados, você pode ouvir a música iluminadora, e quando a música morre você ainda pode sentir, embora pareça difícil, embora esteja escuro, as notas ainda estão ali, em algum lugar, talvez úmidas ou encharcadas, há uma possibilidade de estarem geladas ou intocadas, talvez a Senhorita Clave de Sol já não encaixe perfeitamente ao nosso soprano, talvez não haja mais esperança, talvez seja a hora de congelar na escuridão, talvez seja hora de silenciar a alma, pois tudo que não é música, é silêncio.
E é no silêncio que obtemos a capacidade de ouvir nosso coração, no silêncio do quarto quase vazio de ar que os pensamentos surgem. E, fazem com que as batidas do coração que nos foi dado sejam preenchidas de notas que vão aumentando, como os tambores de uma bateria daquela música incrível, inspiradora, e encorajador, que nos faz prosseguir mesmo de olhos fechados.
Estamos aqui parados, e você nem mesmo esta para mim como uma luz amarela ou fraca, que pudesse iluminar meus pés, me deixando sair desta escuridão e achar a minha música, e achar a minha esperança. Estamos aqui, e nem ouvimos o nosso sussurro que também pode ser a música clamando pelo nosso socorro. Estamos aqui, e as lágrimas que vão cair ao chão podem ser o som que estamos procurando, não podemos ver, mas gosto de pensar que há galhos batendo na janela branca, que agora, já não tem mais cor, tudo perdeu a cor. E o nosso silêncio, agora, pode ser a nossa música, pode ser a nossa luz.
Neste quarto escuro, mesmo já acostumado com esta situação, esta cor, este silêncio; a presença de algo novo para tornar-nos diferente, seria incrível. Talvez uma luz vinda de um teto tangente, quem sabe? E enquanto a chuva se movimenta lá fora, estamos parados aqui, vamos juntar as mãos e andar devagar sobre o chão que estrala em meio às frestas frias. Podemos tirar as coisas pequenas para não tropeçarmos, vamos arrumar aquilo que não vemos, mas sabemos que está lá. Podemos tirar o medo, a solidão, podemos colocar as coisas no seu lugar, podemos jogar fora toda ausência de fé. E assim como o papel velho está para o lixo, nossa solidão está para o infinito.
Eu já posso sentir que há um espaço vazio e cômodo, podemos agora, nos prostrar sobre este chão frio com cera vermelha e pedir ao Abajur Iluminado que acenda em nós a chama que agora é cinza, que acenda em nós a vida, que renove a nossa fé, que nos faça ver, que nos faça perceber que mesmo este quarto vazio, e esta situação que, tornou-se tão amedrontadora não passam de um disco riscado diante Dele, do Abajur Iluminado.
Prostrados, o Abajur Iluminado nos ouve, e eu posso começar a ouvir a música, Ele está nos devolvendo nossas notas, Ele está voltando-se para nós. Há um calor cobrindo o ar fresco, há uma nova esperança, há uma luz que indica o caminho de saída, há uma força abrindo a porta. Podemos ir, podemos voltar às cores, podemos tocar o piano empoeirado e esquentar a água do café, podemos atar os nossos cadarços e colocar vestes limpas, podemos seguir em frente, o Abajur Iluminado nos salvou.

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